domingo, 16 de julho de 2017

Baby Driver - A Diegese Sonora Como Elemento Visual


Edgar Wright é um mestre moderno. Com uma fornada de títulos bastante peculiares, que começou com o relativamente desconhecido A Fistful of Fingers e uma série de culto (Spaced), a notoriedade chegou em 2004 com Shaun of the Dead (cujo título em Português me recuso a pronunciar), uma comédia de zombies que servia como homenagem aos clássicos de terror, mas principalmente à saga de George A. Romero. A direcção, montagem, elementos de comédia visual e ritmo da obra chamaram a atenção e o resultado seria uma trilogia (conhecida como a trilogia do Cornetto), uma conversão com mestria dos graphic novels Scott Pilgrim vs. The World e uma mão no argumento de Ant Man.

Baby Driver surge como o primeiro título de Wright como argumentista a solo e o resultado é, mais uma vez, exemplar.
Baby (um improvável Ansel Elgort - A Culpa é da Estrelas, a saga Divergente) é um jovem com habilidade ao volante que, após ter roubado e destruído propriedade valiosa de Doc (Kevin Spacey), fica obrigado a "trabalhar" para este como condutor de get away de assaltos até pagar a sua dívida. A característica mais notável de Baby é a utilização constante de música para superar o tinnitus (ui! tinnitus? que é isso? vão procurar à wikipédia!) resultante de um acidente de infância.


Baby Driver é, mais uma vez uma criação exemplar de Edgar Wright, onde todos os pontos são tocados no sitio certo e, neste caso, literalmente! O filme é, em grande parte, uma sequência de acções coreografadas ao ritmo da música que Baby ouve. Cena inicial ao ritmo de Bellbottoms de Jon Spencer Blues Explosion sincronizada com o ritmo do assalto e limpa-pára-brisas! Tiroteio ao ritmo de Tequila? Sim, por favor! Ao contrário do que é habitual, a acção é motivada pela banda sonora e não o contrário. A grande parte da música é diegética, e isso ajuda a colocar o expectador no ouvidos de Baby e perceber que o seu mundo é feito em função da sua banda sonora.

Edgar Wright expande aqui conceitos que já vinha a utilizar desde Shaun of the Dead (a luta com o zombie no Winchester pub) e até mesmo desde Spaced e fá-lo de uma forma magistral, com a precisão de um relógio suíço. Wright usa mesmo auto-influências, se tivermos em conta que foi ele o responsável pelo videoclip de Blue Song, dos Mint Royale, em que Noel Fielding canta a canção no carro enquanto espera que os colegas terminem um assalto, enquanto se vai entretendo com os acessórios.


A montagem é, mais uma vez, um dos pontos fortes do filme, como já é hábito com Edgar Wright e ajuda a dar ritmo e fluência à historia. No entanto, ainda na tradição de Shaun of the Dead, o realizador brinda-nos de vez em quando com planos-sequência compostos, como é o exemplo da rotina de Baby, na sua demanda por café; um plano de mais de 3 minutos, com alguns "easter eggs" pelo caminho. De realçar ainda que as perseguições de carro são feitas na sua maioria com efeitos práticos o que ainda torna mais a acção mais realista e convincente.

O filme conta com um elenco notável, com actuações imaculadas, pelo menos na maioria dos casos. Ansel Elgort dá-nos o Baby cool e reservado de forma impecável, Kevin Spacey a fazer de Kevin Spacey resulta bastante bem e o homem nem precisa de se esforçar muito! Jamie Foxx mais uma vez a mostrar a sua versatilidade, no papel do tipo que toda a gente adora odear. Metam ainda Jon Hamm, Jon Bernthal, Eiza González (quem?), Flea (dos Red Hot Chilli Peppers) e temos obra feita.


Onde o filme perde um bocado, no entanto, é no argumento. Aqui o estilo é preponderante. A substância nem tanto. E isto é particularmente notável quando o interesse amoroso de Baby entra em cena. Lily James é Debora, a empregada de mesa por quem Baby se apaixona. Embora a relação seja perfeitamente plausível (mesmos interesses musicais), o desenvolvimento parece um pouco apressado e sem bases. Debora toma decisões bastante abruptas, que a podem pôr em perigo sem se questionar muito. No entanto, e apesar da história da película pecar um pouco por falta de conteúdo, isto não retira mérito ao filme.

Baby Driver combina música com o ritmo de acções na perfeição e só vem demonstrar que Edgar Wright está em forma e recomenda-se!