Imaginem um mundo onde a sociedade pressiona as pessoas solteiras a encontrarem um parceiro e formarem uma família para não morrerem sozinhas, para que não sejam postos de parte pelos seus pares! Ridículo, certo? Imaginem viver num mundo assi... Oh.... espera lá!
The Lobster (2015) é a primeira longa-metragem de língua inglesa do realizador e argumentista grego Yorgos Lanthimos (quem?) que, entre outros projectos, é responsável pelo singular "Canino"(2009). Apresentado num futuro distópico, The Lobster dá-nos a conhecer uma sociedade em que os solteiros enfrentam um destino não muito favorável: têm 45 dias para encontrar um parceiro, ou então serão transformados num animal à sua escolha.
Neste lote de desafortunados encontra-se David (Colin Farrell), recém-trocado pela sua mulher, que é enviado para um hotel onde deve encontrar a sua alma gémea. Caso não tenha sucesso, David quer ser transformado numa lagosta porque, segundo ele "chegam a viver 100 anos, têm sangue azul como a realeza e permanecem férteis toda a sua vida".
The Lobster é uma aguçada crítica à sociedade e às convenções que pressionam as pessoas a encontrarem um par para terem uma vida "normal". Os solteiros são aqui cidadãos de segunda, perseguidos pelas autoridades e olhados de lado pelas restantes pessoas. O destino que os aguarda, caso não consigam um parceiro, é a humilhação de viver como animal, eternamente postos de parte.
O filme é uma comédia negra, que leva o seu tempo. Com planos fixos onde nada acontece, a monotonia instala-se. Mas é uma monotonia com razão de ser. Os personagens são praticamente unidimensionais, muitas vezes com discursos mono-tónicos. Quase desprovidos de emoções, guiados por opções binárias (bissexualidade, que é isso?), os solitários procuram um parceiro, não com base na personalidade, mas sim numa característica em comum. No caso de David, a sua incapacidade de enxergar sem óculos.
Colin Farrell (mais gordinho) dá-nos aqui uma interpretação longe dos seus tempos de escolhas duvidosas *coughdaredevilcough*, com um David que não se distância muito do resto dos seus pares. Monótono, artificial, disposto a mentir a si próprio e a fingir ser uma pessoa que não é, só para conseguir "engatar" uma mulher. Aliás, David é o único personagem com nome próprio definido. O espectador nunca chega a saber a identidade dos restantes. E isso não interessa. É esse o objectivo.
Mesmo quando David resolve fugir e juntar-se a um grupo de solitários que também se escaparam, o panorama não é muito favorável. David pode agora masturbar-se (!!!), mas está impedido de qualquer contacto intimo com os restantes membros. A troca de um extremo por outro!
A genialidade em The Lobster passa por dar ao espectador tudo aquilo que ele não quer, mas que aceita de bom grado. A monotonia presente em todo o filme, a quase completa falta de emoções dos personagens, o tom artificial das suas representações, a música aborrecida e repetitiva ao longo das cenas do hotel, tudo isto serve para nos acentuar o absurdo desta sociedade, que na verdade não é muito diferente da nossa. As pessoas julgam-se por uma característica, em vez de um todo e o amor é puramente artificial.
Mesmo quando David encontra (ilegalmente) o seu par ideal (Rachel Weisz) no meio dos solitários foragidos, a sua relação é baseada numa característica comum: os problemas de visão! O final aberto deixa-nos pendurados, entre a escolha do sacrifício ou o egoísmo de David: em ambos os casos, trágico e absurdo!
O filme, que conta ainda com John C. Reilly, Léa Seydoux e Ben Whishaw, foi nomeado ao Óscar de melhor argumento e ganhou o Prémio do Júri no festival de Cannes.