domingo, 21 de junho de 2015

It's All Gone Pete Tong - O Som Como Elemento Visual


"It's All Gone Pete Tong", realizado em 2004 pelo Canadiano Michael Dowse, é um pequeno filme independente baseado numa história real que nunca existiu. Apresentado como uma história verídica, "It's all Gone..." é uma comédia dramática com elementos de mockumentary, que retrata a carreira de Frankie Wilde (Paul Kaye, o Thoros of Myr de Game of Thrones), um famoso DJ no pico da sua actividade, que tem especial sucesso nos clubes de Ibiza, que é como um ambiente natural para ele. Devido ao excesso de barulho injectado directamente nos ouvidos (e drogas pelo nariz acima), Frankie começa a ficar parcialmente surdo e, eventualmente acaba por perder totalmente a audição. Como consequência, a sua carreira acaba, assim como a sua vida social. Isto até conhecer Penelope Garcia (a portuguesa Beatriz Batarda), uma espanhola, surda, que sabe ler lábios em Inglês (quais são as hipóteses disso acontecer?) e que parece ser o único elemento de uma organização que ajuda surdos a aprender a ler lábios (!!!).

O filme é uma sátira convencional, mas ao mesmo tempo brilhante da vida de uma estrela, com todos os clichés a que pode ter direito. Frankie é famoso, rico, viciado em cocaína, tem as mulheres que quer e que o seu agente faz questão de providenciar e acaba por se casar com uma supermodelo, que não deve muito à inteligência, fresca, que não o ama, mas que é sempre útil para manter aparências. Com a nova esposa vem incluído o seu filho, negro, fruto de uma relação (sexual) com o promotor de Frank. Tudo isto é apresentado de maneira descontraída e divertida, mas com credibilidade suficiente para nos convencer que o que estamos a ver poderia ter realmente acontecido. Pelo meio o protagonista tem ainda de lutar (literalmente) com demónios internos, nomeadamente o vício, representado por uma doninha antropomórfica!



No entanto, onde o filme realmente triunfa, é no manuseamento do som como elemento visual complementar. Sem contar com um pequeno flash-foward, o filme abre com Frankie a ser entrevistado em Ibiza. Logo aí, o DJ começa a mostrar sinais de surdez ao não conseguir entender completamente as perguntas da entrevistadora. Um avião passa directamente por cima das personagens e o seu som abafa os sons humanos, como que um sinal do que vem aí.
A primeira vez que Frankie nota que a sua audição está afectada, é no conforto de sua casa, quando está a ver um jogo de futebol. O sinal de surdez é-nos dado pelo zumbido continuo no ouvido direito de Frank. Quando isto acontece, a imagem da televisão que até aqui era clara, tanto para o personagem, como para o espectador, fica desfocada. Surge aqui uma complementação do som e imagem que guia o público para a mente da personagem.

A partir daqui, o realizador dá-nos um filme em que, tal como o protagonista, o espectador é convidado a tirar partido dos elementos visuais onde o som escasseia ou simplesmente não existe. Em momentos particulares, o público experiência a surdez da personagem, mas só quando é essencial para nos pormos na pele do DJ. Quando Frankie conhece Penelope e aprende a maximizar os seus restantes sentidos activos, é possível visualizar o som através de vibrações e, mais tarde através de linhas de amplitude sonora. Por outro lado, é possível também visualizar o silêncio no movimento labial das personagens, quer seja uma coisa importante, onde Frankie se esforça por entender o que lhe é dito, quer seja uma mensagem inútil, onde Frankie decide fechar os olhos e assim deixar de "ouvir" e onde o espectador é deixado com o movimento labial das personagens, sem sonoridade, representando a inutilidade das palavras proferidas.


O filme esforça-se para dar credibilidade à história, apresentando até pequenos excertos de entrevistas com famosos DJ's como Carl Cox, Tiesto, Paul Van Dyk ou Lol Hammond, todos a dar o seu testemunho sobre a lenda que era Frankie Wilde e a influência que teve para a música electrónica. A obra conta também com um cameo de Pete Tong, que também produziu o filme.
Um pequeno filme, bastante divertido, mas competente, que vale a pena ver!