quarta-feira, 26 de outubro de 2016

3 nunca é demais - Animação Japonesa

O título deste segmento pode implicar uma leve derivação à temática das orgias. É propositado. Aliás, são tantas as minhas habilitações de "marketing-web" (com aspas e merdas) que ao colocar algo maroto no título posso receber algumas visualizações de curiosos em rambóias. 

Vamos? Vamos, é melhor para todos.
Quando comparado ao chamado cinema "live-action" o cinema de animação tende a ser colocado num patamar diferente. Quer a nível de temática, densidade da narrativa e Art Style (o desenho propriamente dito) as grandes companhias de animação americanas trabalham sempre para espectadores infantis (e eventualmente os seus pais) o que faz com que apesar de diferentes os seus filmes tenham atmosferas semelhantes, com poucos riscos narrativos e muita retribuição gratuita. 

A propósito da reforma de Hayao Miyazaki (não tão reforma) vale a pena olhar para um dos seus filmes mais emblemáticos e apresento mais dois, provavelmente menos conhecidos mas igualmente criativos e que transcendem a linguagem cinematográfica dos filmes de animação pela sua qualidade.

Mononoke Hime (1997)

Traduzido para Portugês como "A princesa Mononoke" (Mononoke é uma antiga palavra japonesa que pode significar "espírito" ou "monstro") é normalmente considerado a mais bem conseguida obra de Miyazaki. Situado num Japão Feudal onde humanos convivem com espíritos e deuses, sobre a forma de animais falantes, um jovem amaldiçoado vê-se envolvido numa guerra cada vez maior entre os habitantes da Aldeia do Ferro e os espíritos da floresta, representados por lobos. As suas convicções dividem-se quando conhece San, uma rapariga criada por lobos, e precisa de escolher entre cooperar com os humanos ou ajudar a carismática rapariga.


Akira (1988)
Num Japão pós-terceira guerra mundial, onde algumas pessoas nascem com o dom de possuir poderes psíquicos, um adolescente pertencente a um gang de motoqueiros, revela capacidades acima da média e é contido por uma agência governamental . Instável e perturbado, Kaneda perde o controlo dos seus poderes enquanto militares e membros do gang procuram a verdade sobre Akira, uma entidade misteriosa que consegue ultrapassar os poderes de Kaneda.

Ambientado num futuro Steampunk o filme combina cenas de acção super-dinâmicas (provavelmente dos mais bem animados filmes deste género) com cenas experimentais, mais adultas e que reforçam algumas questões éticas do filme. 


Perfect Blue (1997)

Um filme de referência para todos os fãs de filmes com narrativas densas e complexas e destes três aquele mais deslocado de um "universo maior do que a vida". 
Uma bem sucedida cantora pop japonesa (o material dos pesadelos para os japoneses) decide tornar-se actriz, procurando o reconhecimento e maturidade do público. A perseguição de um estranho fã obcecado e a exigência imposta em Mima quebra-lhe as realidades, ficando num limbo psicológico entre que o que faz por trabalho (uma violação encenada para uma série de televisão) e a realidade. 

Categorizado como terror mas nunca saindo da paranóia da actriz, o filme influenciou a forma de conceber thrillers psicológicos desde a sua saída.
                                                             (Perfect Blue e Black Swan)

sábado, 22 de outubro de 2016

Swiss Army Man - Poesia com Bufas


Para começar: esqueçam  Harry Potter... Prontos! Agora que isto está despachado, vamos ao que interessa!

Swiss Army Man, vencedor do prémio de melhor realização do festival de Sundance de 2016, é um filme diferente. Muito diferente. É divertido, é nojento, é negro, é perverso. É, no entanto, um dos filmes mais brilhantes dos últimos tempos.
A primeira longa metragem de Dan Kwan e Daniel Scheinert (quem?) apresenta-nos Hank (Paul Dano), um homem isolado numa ilha deserta, à beira de desistir e cometer suicídio. Quando está prestes a concretizar a auto-execução, dá à costa um corpo (Daniel Radcliffe). Após uma examinação, Hank conclui, com um flato largado pelo cadáver, que o jovem está mesmo morto. Desiludido, Hank regressa à sua ideia original de pôr termo à vida, mas não sem antes se aperceber que o corpo se consegue auto-impulsionar na água com a força dos gases (sim, o que acabaram de ler!). Hank monta-se no corpo e consegue sair da ilha e regressar à civilização, ou pelo menos perto dela. Depois de descobrir que o cadáver afinal fala e se chama Manny, Hank usa-o como um multi-ferramentas para regressar a casa.


Piadas sobre gases, erecções, pensamentos incestuosos, mamas e suicídio... Tudo isto faz parte de Swiss Army Man e funciona que é um mimo. No entanto, muito para além do divertimento, este filme é profundamente simbólico. Inicialmente Hank é uma pessoa isolada, sem ninguém que o ame ou que se importe com ele (pelo menos na sua opinião). Hank é a ilha deserta. Manny, por sua vez é inocente e ingénuo, não percebendo por exemplo, porque é que as pessoas não largam gases em público ou porque é que começa a ter uma erecção quando vê a imagem de uma mulher atraente. Hank é mais racional, Manny é mais impulsivo. Isto tem conotações fortes com os vários níveis de consciência. O cadáver pode ser entendido como o id (olá, psicologia!) de Hank, revelando os instintos básicos e falando livremente tudo o que o jovem tem medo de dizer ou de assumir. Quando Manny se lembra finalmente do nome da mulher por quem Hank está apaixonado, mesmo sem nunca a ter conhecido, significa que o mesmo se encontra enterrado no subconsciente de Hank, que o terá ouvido em alguma ocasião, mas não consegue subir à superfície da memória.


Há medida que o filme avança, a personagem de Paul Dano vai evoluindo e vai aprendendo a aceitar-se a si próprio. Quando no inicio é Hank que tem de transportar o corpo imóvel de Manny, pelo final do filme já estamos a assistir ao contrário. Hank aprende a fazer as pazes com o seu id, com os seus instintos e defeitos e o apogeu acontece quando Paul Dano e Daniel Radcliffe se beijam (no homo!) numa cena subaquática, saindo impulsionados da água pelas bufas de Manny (maybe homo!)!

Existem poucos filmes tão originais como Swiss Army Man e também como a sua banda sonora. Constituída quase exclusivamente de canções cantadas por Paul Dano e Daniel Radcliffe, a soundtrack contêm uma versão curta, mas deliciosa do clássico chunga "Cotton Eyed Joe", dos Rednex!

O filme conta também com Mary Elizabeth Winstead no papel do interesse amoroso de Hank.